Realismo Mágico: onde o fantástico se encontra com o cotidiano

Realismo Mágico: onde o fantástico se encontra com o cotidiano

Se você já leu algum livro de Gabriel García Márquez, Isabel Allende, Jorge Luis Borges ou qualquer outro autor latino-americano, com certeza já esbarrou no realismo mágico. 

Sabe aquela história em que coisas fantásticas acontecem e parece muito mais um fato corriqueiro do que realmente extraordinário? Isso é realismo mágico, ou fantástico, como também é chamado. Mas o que é realismo mágico e qual é sua importância para a literatura? Vem descobrir com a gente!

O que é Realismo Mágico? 

O termo “realismo mágico” foi cunhado pelo crítico de arte alemão Franz Roh em 1925, para descrever uma forma de pintura que combinava realidade com elementos fantásticos. 

No entanto, foram nas décadas de 1940 e 1950 que o conceito foi adotado pelos escritores latino-americanos, especialmente no contexto do boom da literatura latino-americana — esse é um papo para outro texto, mas resumidamente, o boom latino-americano ocorre quando os escritores latinos ganham reconhecimento internacional, principalmente nos Estados Unidos e na Europa. 

O realismo mágico surge numa época em que os países da América Latina enfrentam movimentos ditatoriais e autoritários que se alastraram por diversos países da região durante o século XX. 

O marco inicial foi em 1948 com o livro “Letras y hombres de Venezuela”, do escritor venezuelano, Arturo Ular Pietri. Depois dele, muitos outros escritores buscaram a fusão de elementos reais e fantásticos para expressar e sobretudo, criticar determinados padrões e conjunturas que ocorriam no mundo e na América Latina.

Alguns exemplos são Juan Rulfo, em “Pedro Parámo”, Gabriel García Márquez em “Cem Anos de Solidão”, Isabel Allende com “A Casa dos Espíritos”, entre outros escritores. 

As principais características do gênero são a presença de elementos fantásticos ou mágicos (a combinação do real e do irreal), experiências sobrenaturais e uso do tempo cíclico em vez do tempo linear.

Talvez você esteja se perguntando “por que sua origem se deu na América Latina? O que tem de tão especial nessa parte do continente?” e nós te respondemos: a América Latina, com sua rica herança cultural e uma história marcada por conquistas, colonização e revoluções, apresentou o cenário ideal para o surgimento do realismo mágico. As tradições indígenas, as crenças populares e o misticismo religioso se combinaram com as realidades políticas e econômicas complexas para criar uma atmosfera propícia para esse estilo literário. 

O poder de encantamento do Realismo Mágico

O impacto do realismo mágico vai além das fronteiras da América Latina. O gênero se popularizou mundialmente, encantando os leitores por sua capacidade de abordar  temas profundos como a exploração, o poder, a memória e o destino, tudo isso sem abandonar o senso de maravilha. Ele oferece uma nova perspectiva sobre a realidade, desafiando o leitor a enxergar o mundo através de um véu de mistério e beleza.

Gabriel García Márquez, talvez o mais famoso escritor do gênero, afirmou certa vez que “é só realismo. A realidade que é mágica. Não invento nada. Não há uma linha nos meus livros que não seja realidade. Não tenho imaginação”. Essa citação define a essência do realismo mágico: a ideia de que a realidade é moldada tanto pela experiência quanto pela imaginação, e que a magia está presente, mesmo nas coisas mais cotidianas.

No Brasil, o gênero também se desenvolveu entre os escritores. Os precursores foram José J. Veiga, com “Os cavalinhos de Platiplanto”, de 1959. Além dele, também destacam-se Murilo Rubião, Guimarães Rosa, Jorge Amado, Machado de Assis, entre outros.

O realismo mágico se tornou um símbolo da literatura latino-americana, permitindo que as vozes do continente fossem ouvidas de maneira única e cativante. 

O gênero desafia percepções e transporta o leitor a uma realidade em que o impossível se torna possível, revelando as camadas profundas e complexas da condição humana. Em um mundo cada vez mais racionalista, o realismo mágico lembra que, em meio à realidade, há sempre espaço para a magia.

Conheça obras de realismo mágico

Torto Arado

Um texto épico e lírico, realista e mágico que revela, para além de sua trama, um poderoso elemento de insubordinação social.

Nas profundezas do sertão baiano, as irmãs Bibiana e Belonísia encontram uma velha e misteriosa faca na mala guardada sob a cama da avó. Ocorre então um acidente. E para sempre suas vidas estarão ligadas — a ponto de uma precisar ser a voz da outra. Numa trama conduzida com maestria e com uma prosa melodiosa, o romance conta uma história de vida e morte, de combate e redenção.

A Cabeça do Santo

Pouco antes de morrer, a mãe de Samuel lhe faz um último pedido: que ele vá encontrar a avó e o pai que nunca conheceu. Mesmo contrariado, o rapaz cumpre a promessa e faz a pé o caminho de Juazeiro do Norte até a pequena cidade de Candeia, sofrendo todas as agruras do sol impiedoso do sertão do Ceará.

Ao chegar àquela cidade quase fantasma, ele encontra abrigo num lugar curioso: a cabeça oca e gigantesca de uma estátua inacabada de santo Antônio, que jazia separada do resto do corpo. Mas as estranhezas não param aí: Samuel começa a escutar uma confusão de vozes femininas apenas quando está dentro da cabeça. Assustado, se dá conta de que aquilo são as preces que as mulheres fazem ao santo falando de amor.

Já consagrada por seus livros infantojuvenis, a escritora Socorro Acioli apresenta este seu primeiro romance dirigido ao público adulto, desenvolvido na oficina Como Contar um Conto, promovida por Gabriel García Márquez em Cuba.

O Parque das Irmãs Magníficas

Quando chegou à cidade de Córdoba para estudar na universidade, a autora argentina Camila Sosa Villada decidiu ir ao Parque Sarmiento durante a noite. Estava morta de medo, pensando que poderia se concretizar a qualquer momento o brutal veredito que havia escutado de seu pai: “Um dia vão bater nessa porta para me avisar que te encontraram morta, jogada numa vala”. Para ele, esse era o único destino possível para um rapaz que se vestia de mulher.Camila queria ver as famosas travestis do parque, e lá, diante daquelas mulheres e da difícil realidade a que são submetidas, foi imediatamente acolhida e sentiu, pela primeira vez em sua vida, que havia encontrado seu lugar de pertencimento no mundo.
O romance “O parque das irmãs magníficas” é isso tudo: um rito de iniciação, um conto de fadas ou uma história de terror, o retrato de uma identidade de grupo, um manifesto explosivo, uma visita guiada à imaginação da autora. Nestas páginas convergem duas facetas da comunidade trans, facetas que fascinam e repelem sociedades no mundo inteiro: a fúria travesti e a festa que há em ser travesti.

A Fúria 

Finalmente vemos chegar ao Brasil um livro de Silvina Ocampo, que está entre os escritores mais surpreendentes e intensos do continente. Publicado em 1959, “A Fúria” é considerado “o mais ocampiano” dos livros de Silvina, obra em que a autora encontra sua voz única e inaugura seu universo alucinado.

Saídas do que Roberto Bolaño chamou de “uma limpa cozinha literária”, suas histórias misturam elegância e excesso, distanciamento e intensidade, calma e horror. Há a influência macabra que a antiga dona de uma casa exerce na nova inquilina (“A casa de açúcar”, o conto favorito de Julio Cortázar); adivinhos e premonições (“A sibila” e “Magush”); amores loucos (“A paciente e o médico”); a festa de aniversário de uma jovem paralítica (“As fotografias”); e uma profusão de crianças malignas, como a que incendeia cruelmente uma amiga no conto que dá título ao livro. 

Revalorizada com entusiasmo nos últimos anos, a literatura de Silvina Ocampo é singular, complexa, envolvente e nos convida, como poucas, à fantasia e à imaginação.

Ficções

“Ficções” reúne os contos publicados por Borges em 1941. Nesses textos, o leitor se defronta com um narrador inquisitivo que expõe, com elegância e economia de meios, de forma paradoxal e lapidar, suas conjecturas e perplexidades sobre o universo, retomando motivos recorrentes em seus poemas e ensaios desde o início de sua carreira: o tempo, a eternidade, o infinito. 

Em “Ficções” estão alguns de seus textos mais famosos, como “Funes, o Memorioso”, cujo protagonista tinha “mais lembranças do que terão tido todos os homens desde que o mundo é mundo”; “A biblioteca de Babel”, em que o universo é equiparado a uma biblioteca eterna, infinita secreta e inútil; “Pierre Menard, autor do Quixote”, cuja “admirável ambição era produzir páginas que coincidissem palavra por palavra e linha por linha com as de Miguel de Cervantes”; e “As ruínas circulares”, em que o protagonista quer sonhar um homem “com integridade minuciosa e impô-lo à realidade e no final compreende que ele também era uma aparência, que outro o estava sonhando”.

Beatriz Gouvêa

Jornalista e Especialista em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais, faz parte da equipe de Marketing da Tocalivros. Ama literatura latino-americana e brasileira, sendo entusiasta de tudo que envolve nossa região.

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