Poderíamos começar assim: Falecida em 2019, Toni Morrison estreou como romancista em 1970, com ‘O olho mais azul’. Em 1975, foi indicada para o National Book Award com a obra ‘Sula’ (1973). ‘Amada’ (1987) lhe valeu o prêmio Pulitzer, e ela se tornou a primeira escritora negra a receber o prêmio Nobel de literatura, em 1993.
Mas ainda seria pouco.
Os méritos da autora norte-americana Toni Morrison não se traduzem apenas às suas inúmeras premiações ou ao ineditismo de suas condecorações. Suas ideias, seus romances, e sua escrita ultrapassam os limites da literatura, tornando-a uma das principais escritoras e pensadoras contemporâneas.
Nascida em Lorain, Ohio, Estados Unidos, no dia 18 de fevereiro de 1931, filha de operário, foi criada como a grande maioria dos negros de sua região: uma infância pobre, cheia de dificuldades, e ouvindo muitas histórias sobre a comunidade negra dos Estados Unidos.
Excelente aluna, ingressou na universidade de Howard e estudou inglês e literatura clássica. Em 1953, iniciou o mestrado em literatura na Universidade Cornell, Nova York, onde escreveu sua tese sobre Virginia Woolf e Faulkner. Por nove anos, dedicou-se exclusivamente ao ensino.
Casou, teve dois filhos, se separou ainda grávida e achou um novo ambiente para trabalhar: a famosa editora Random House – onde, ao longo dos anos, desempenhou papel essencial na difusão de escritores negros como Ângela Davis, e na organização de antologias dos autores africanos.
Escreveu por cinco anos o que viria a ser O Olho Mais Azul, lançado em 1970. Morrison seguiu. Publicou Sula (1973), A canção de Solomon (1977) e Tar baby (1981), Amanda (1987).
Destacando-se entre os romancistas norte-americanos e acumulando prêmios, trouxe a representatividade negra para o meio literário: a primeira mulher negra celebrada no Book of the Month Club, capa da revista Newsweek em mais de quarenta anos.
Toni Morrison não cabe em poucas palavras: Negra, mulher, ativista, autora de onze romances, cinco livros infantis, oito obras de não ficção, peças de teatro, contos e libretos para ópera.
Em cada texto, um relato da história sociopolítica dos afro-americanos, a escravidão em seu país, os medos, as mortes, a sobrevivência e a realidade.
“O que eu faço é remover os curativos para que a cicatriz seja vista, a realidade. Não devemos ter medo de olhar para o passado porque só assim sabemos quem somos” – Toni Morrison.
Alguns livros de Toni Morrison
Considerado um dos livros mais impactantes de Toni Morrison, conta a história de Pecola Breedlove, uma menina negra que sonha com uma beleza diferente da sua. Negligenciada pelos adultos e maltratada por outras crianças por conta da pele muito escura e do cabelo muito crespo, ela deseja mais do que tudo ter olhos azuis como os das mulheres brancas. Mas, quando a vida de Pecola começa a desmoronar, ela precisa aprender a encarar seu corpo de outra forma. Poderosa reflexão sobre raça, classe social e gênero. Livro atemporal e necessário.
Amada ganhou o Pulitzer de 1988 e foi eleito em 2006 pelo New York Times a obra de ficção mais importante dos últimos 25 anos nos Estados Unidos. Uma história real ambientada em 1873, época em que os EUA começavam a lidar com as feridas da escravidão recém-abolida. Sethe, uma ex-escrava que, após fugir da fazenda em que era mantida cativa com os filhos, refugiar-se na casa da sogra em Cincinatti. No caminho, ela dá à luz um bebê, a menina Denver, que vai acompanhá-la ao longo da história. A relação familiar, bem como os traumas do passado escravizado, transformarão a vida e o futuro de ambas de forma irreversível.
Considerado um clássico contemporâneo, Amanda é um retrato lírico e cruel da condição do negro no fim do século XIX nos Estados Unidos.
Um texto sincero e comovente sobre sua busca pelo verdadeiro Martin Luther King Jr., um elogio emocionante a James Baldwin, uma oração ardente pelos mortos do 11 de setembro. “A fonte da autoestima” é uma coletânea de textos sobre sociedade, cultura e arte que reune ensaios e discursos mais importantes da autora. Coletânea essencial para entender Toni Morrison, uma das vozes mais importante dos últimos anos.
No pobre meio-oeste dos Estados Unidos, Nel e Sula compartilharam segredos e sonhos. Mas então Sula foge para viver seus sonhos e Nel se casa. Dez anos depois, Sula retorna. Como é possível voltar a se conectar com um passado que carrega tanta mágoa e um segredo tão profundo? Um impactante relato sobre a amizade entre duas mulheres e a pressão que a sociedade exerce sobre o desejo feminino.
Baseado nos discursos que a autora proferiu na universidade de Harvard, A origem dos outros é uma busca de respostas para questões históricas, políticas e literárias sobre o racismo e a radicalização da identidade. Morrison analisa autores desde Harriet Beecher Stowe até Ernest Hemingway e William Faulkner para entender melhor o papel da narrativa no estabelecimento dos padrões de pensamento racial. Atual, aborda os temas que estamos acostumados a ver banalizados e desencorajados no debate público e aqui abordados pela escritora com extrema elegância. Prefácio de Ta-Nehisi Coates. Leitura necessária.
1926. Harlem, bairro negro de Nova York. Povoado sobretudo por gente que veio do campo em busca das promessas de boas novas, Joe Trace mata com um tiro sua amante adolescente. No funeral, Violet, mulher de Joe, ataca o corpo da rival com uma faca. Uma tragédia pessoal e prenúncio dos tempos duros que virão na década seguinte.
Um romance visceral que recria a temática e a forma da música de blues, onde a autora fala sem reservas das injustiças praticadas contra mulheres negras e afirma-se como a última escritora clássica americana, na tradição de Poe, Melville, Twain e Faulkner. Apaixonada história de amor e obsessão que avança e recua no tempo, reunindo emoções, esperanças, temores e as duras realidades da vida negra nas cidades dos Estados Unidos da primeira metade do século XX.
Carlos Galego é assessor de comunicação da Tocalivros, com larga experiência no mercado cultural e de entretenimento.
É autor de dois livros e escolhido entre os 20 principais poetas nacionais em 2021 pelo Poetize.
Editor de trabalhos como Ruídos Urbanos (de Ricardo Martins), Poesia de Mim (de Vanessa Lima), Vou Ali e já volto! (de Gerson Danelon) e Frases da vida (de Alma Impressa).
Se dedica também a artes visuais, e ministra aulas e cursos de comunicação para setor privado, e oficinas de comunicação cultural em Secretarias de Cultura municipais